terça-feira, 2 de outubro de 2012

De Marília Para Rebeca

A melhor amiga. Todo mundo tem e sabe que a vida fica mais leve por causa dela. Ela é aquela pessoa que encontrou mais fácil que os outros a porta dos nossos afetos, não se acanhou e foi logo entrando. Não que o amor possa ser categorizado, mas no Livro do Amor, “amor de amiga” é um capítulo que fala de um sentimento desinteressado. Melhor amiga é uma espécie de alma gêmea, ela nos entende como mais ninguém. Elas sabem direitinho do que estamos falando quando contamos sobre uma cólica terrível, ou uma vitrine imperdível, quando falamos das nossas dores e dos nossos amores. Nos olhos da nossa best friend a gente se vê com mais frescor, se vê um pouco mais menina. Amor de amiga é um gostar com ares de boas-vindas.

Melhor amiga pode ser a mãe, a irmã ou aquela querida que esbarrou na nossa vida. O fato é que só pra ela a gente empresta aquela bolsa linda e a nossa confiança absoluta. Pra melhor amiga emprestamos nossos livros, nossos discos, e em caso de urgência, emprestamos até a escova de dentes. A gente só não empresta o namorado porque namorado não se empresta. Mas pai, mãe, vó, papagaio e piriquito, tá tudo liberado e vira uma grande família. Melhor amiga, ás vezes, é até mais que família. Com ela serão divididas todas as alegrias, alegria que só será completa mesmo com ela por perto.

Melhor amiga mesmo a gente só tem uma. Não é afeto de menos à todas as outras amigas, é afeto à mais por essa pessoa em especial. Porque é só pra ela que a gente liga quando o corte de cabelo ficou estanho, quando passou por aquele desengano, ou quando parece que o mundo caiu. Pra melhor amiga dá pra abrir a porta de casa à qualquer hora, mesmo que a casa esteja um caos e a gente, um trapo. Será ela quem vai fazer um chá milagroso, quem vai abrir as janelas, beijar sua dor e mandar você respirar. É nos seus braços que a gente vai desabar. A melhor amiga vai estar do seu lado no hospital, no velório, e se bobear, vai junto até pro sanatório caso dê tudo errado e só nos reste pirar. Afinal, quem é que vai entender as tiradas, comentar a novela e ouvir pela milésima vez as ladainhas dos amores perdidos por ela? Você, claro!

Se você resolver fazer algo de acerto duvidoso, ela vai falar: _ garota, tu não vai fazer isso, vai? – mesmo sabendo que você vai fazer e será ela quem estará la, no portão dos maus ocorridos para, não sem antes dizer: _ eu não te disse?- te abraçar, e vai ser pra ela que tudo você vai contar. Sem reservas. Tudo que a gente não comunica ao mundo porque muitas vezes o mundo é um lugar hostil e deseducado, que vira um bom lugar porque ela nos ajuda a limpar as nossas vidraças, metafóricas e até as literais. Porque melhor amiga é esforço duplo, é a gente em dobro, é cumplicidade. Se a felicidade é feita de simplicidades, melhor amiga é uma das coisas mais simples do mundo. E de maior valor agregado. Com ela a gente faz terapia, tem consultório sentimental, consultoria de moda, troca receitas, risadas e os afetos de melhor qualidade.

Nossa melhor amiga não vai nos julgar. Ela vai entender nossas razões mesmo quando a razão não estiver exatamente por perto. Porque melhor amiga tem orgulho da amiga, independentemente. Ela vai proteger, defender, compreender e até se comprometer por você. Instituição de reciprocidade, a melhor amiga é a irmã que a gente foi lá na vida e escolheu. Acolheu. É a flor que a gente colheu pra alegrar nossas alamedas existenciais. À melhor amiga cabe um agradecimento maior, cabe o reconhecimento de que se há perfume de amizade no ar, a culpa é toda dela, que além de ser linda como uma flor, tem esse perfume de amor.

quinta-feira, 13 de setembro de 2012

Meu adorável

Bom humor é qualidade que vale por dois. Talvez duas vezes dois, ou mais. Bom humor é sinal de saúde. Sinaliza que a mente busca recursos criativos para processar o que os sentidos percebem. Enquanto os sentidos se divertem, o sistema imunológico agradece, renovado. Poderoso, o bom humor é uma emoção que aumenta com o hábito de cultivá-lo no dia a dia, encompridando a sensação que as coisas boas despertam. Ter bom humor é saber permanecer na alegria dos acontecimentos, é demorar-se no que dá certo, é saber evitar o prolongamento das mágoas, é ter a sabedoria de manter a ingenuidade como uma qualidade positiva.

O bom humor faz das pessoas seres mais adoráveis. Pessoas adoráveis são seres recheados de bom humor. Suas mentes regadas por essa corrente do bem são mais rápidas, mais atentas e mais fortes. São mais livres e criativas por causa da predisposição para o riso. Pessoas adoráveis despertam o sorriso e o riso. Adorável é esbarrar no meio da tarde com aquele alguém solar, generoso que nos acrescenta de alegrias elementares:

Você me conduz para o lado bom do dia. Se tem sol, fala da praia, do entardecer, da linda cor que está o céu. Se tem chuva, fala de um bom filme, da delícia de não fazer nada, de como o ar está mais fresco. Se é segunda-feira, fala que a semana promete, me convida para uma cerveja. Se é sexta-feira, me convida pra sair. É dom. É o dom do bom humor. Seu olhar é treinado na prática de olhar bonito para a vida. Se a gente está bonita, o adorável me diz que estou linda, se estou meio feiosa naquele dia, ele me faz sentir, mesmo assim, maravilhosa. Você vai do detalhe à abrangência de uma paisagem toda, ampliando ângulos em busca do que faz feliz. Se você fica mal? Certamente! A pessoa adorável é muito sensível. O que o difere é que você não faz alarde, não se demora na dor. Não a propaga. Ver humor no que não está dando muito certo é uma ótima maneira de ver uma situação por uma prisma inesperado. Adoráveis são os divertidos que enquanto se divertem vivendo, entendem o preciosismo das coisas menores e a importância de baixar a expectativa do olhar.

Disponíveis e calorosas são as mãos do adorável chamando para fazer a ciranda rodar.
O adorável me distrai e me atrai. Dádiva do bom humor que faz o belo parecer mais belo, o alegre parecer mais alegre e o humano, mais humano. Ter bom humor é assumir o risco de ser feliz, pé ante pé, sem ter medo dos tropeços, dos preços e dos eternos recomeços. Adorável é ser meio bobo e conseguir rir de si mesmo. Adorável é aquele que nos faz ver o bobo que reside também em nós. O adorável, portador do estandarte da alegria e do bom humor, é você que faz tudo parecer um pouco mais especial. Coisa de gente bonita.

Você meu amor, é o adorável da minha vida. Portador da felicidade e esperança de que tudo pode ficar bem. Criança que não cresceu e acrescenta ao meu dia o açúcar do amor verdadeiro. Adulto que sabe resolver os problemas e me diz que vai dar tudo certo. Faz da minha vida bonita, alegre, verdadeira, apaixonante e inexplicavelmente adorável!

segunda-feira, 27 de agosto de 2012

Gente feito flor

Você pode regar gente. Gente às vezes murcha, enfraquece, gente desanima, fica sem vitamina, gente também sofre intempéries. E tantas podem ser… Então, você tem o poder da rega. Você é o jardineiro com mãos de cura, ferramentas e insumos. Feito o sorriso. Você rega gente com sorrisos. Aduba com atenção, sendo que o adubo é justamente a atenção. Você canta palavras de estímulo, não deixa a planta sozinha. Você vela madrugadas frias. Faz reza pra espantar as pragas, os mau-olhados, o olho-gordo. Você joga sobre ela a água dos sentimentos mais puros. Você bota reparo, olha com carinho, cobre, descobre, ‘vareia’ de caso para caso, e é quando algo se faz: aquele meio pedaço de gente, aquele meio pedaço de flor murchinha à quem quase mais nada se dava, ressurge nessa fração de amor. Cuidar do outro é um pouco como cuidar da gente mesmo, é como zelar pelo nosso próprio jardim . Porquê é bem desse jeito mesmo: gente que é flor feita todinha de amor.

quinta-feira, 12 de julho de 2012

Fotografia

Para ler ouvindo "Fotografia" de Leoni!

Não era nem ontem, e nós éramos um rostinho inocente posando para um retrato escolar. Olhinhos apertados, espertos, ávidos por ver a vida crescer. Crescemos nós. Já no mundo adulto, aquela foto da escola perdeu-se em alguma caixa parda que guarda fotografias do tempo em que elas eram reveladas. Eram aguardadas no suspense de seu conteúdo. Havia prazer em esperar. Fala-se disso:

- As fotos ficaram boas? - Vem aqui em casa pra ver!. Diálogos dos século passado.
O mundo adulto, hoje, é cheio de pressa. Nem bem viveu-se algo, e esse algo já foi postado em alguma rede. Desfruta de uns segundos de visibilidade, para depois perder-se, em memórias cibernéticas. Será que as crianças de hoje ainda tiram fotos do tipo grupinho escolar? Todas as carinhas reunidas, professora do lado, e um fotógrafo gorducho mandando fazer xis.
Não há muito tempo para esperas e aguardos. Hoje, é tudo para hoje. Será que no meio de tanta aceleração, dá tempo de se perguntar onde estarão aqueles meninos e meninas do nosso retrato escolar? Caminhos que nos engolem enquanto tentamos acrescentar alguns minutos à mais nas nossas horas corridas, e lá se foram os nossos primeiros melhores amigos.
A que se presta esta nostalgia? Serventia prática, nenhuma! Pensamentos miúdos não se prestam. Eles prezam. Prezam alguma coisa de valor que vai se perdendo pra não se perder tempo, e que podia ‘não’.

Podia-se não perder contato com as pessoas queridas.
Podia-se responder os e-mails com muito mais palavras.
Podia-se telefonar ao invés de encurtar tudo por sms.
Podia-se ganhar da preguiça e chamar amigos pra um jantarzinho.
Podia-se ultrapassar o tédio e organizar uma viagem.
Podia-se fazer mais visitas, pra se ver ao vivo e à cores.
Podia-se escrever uma carta, pra lembrar da própria caligrafia.
Podia-se largar mão de artificialidades e conversar com mais vontade.
Podia-se deixar pra lá a vaidade, e expor os sentimentos com mais verdade.
Podia-se deixar o orgulho de lado e procurar reacender os afetos congelados.
Podia-se dar um tempo aos formalismos das relações, e sair por aí, abraçando os outros,
beijando os outros, olhando nos olhos dos outros…
Podia-se redescobrir aquele amigo, daquele tempo, e surpreender…

Em meio à tantas metas e prazos, a gente sabe que é na companhia do outro, na intenção e na atenção dedicados à amizade e ao encontro que a vida faz sentido. Sem perder tempo com as miudezas que importam, perdemo-nos todos. Perdidos e acelerados, periga que um dia, a gente não se ache mais.



‘Ultimamente têm passado muitos anos.’

Rubem Braga

sexta-feira, 22 de junho de 2012

Carta III

(...)

"Embora seja a pessoa mais corajosa que eu conheça deve se sentir no direito de ter medo, entretanto não deve deixar o medo tomar conta da sua vida e impedí-la de realizar seu sonhos. Não tenha medo de sonhar, não tenha medo de desejar coisas ou situações que não teve ou não vivenciou, cada pessoa no mundo tem sua parcela de cicatrizes, elas não devem fazer com que você tenha medo. Ame e não tenha medo de amar. Se agarre ao amor enquanto pode, lute para que ele a transforme e não tenha medo de desejar ter uma família. As pessoas são diferentes, abelhinha, nem todo mundo comete os mesmos erros. O amor pode dar certo para você. Ame a si mesma e assim estará pronta para dedicar seu coração a outra pessoa."

(...)

"Estude muito, se esforce para que seus sonhos sejam realizados com honra e integridade, não deixe que a ambição influencie nos seus objetivos, não esqueça os seus valores que já são tão sólidos mesmo você ainda sendo uma menina. Quando for uma grande profissional não deixe que isso se sobreponha a sua família, não deixe que os compromissos do dia a dia ou o desejo de fazer justiça tome o lugar que deve ser dedicado a sua família. Você será uma boa mãe, não importa o quanto diga que não quer ter filhos. Você terá."

(...)

"Não tenha medo de ser feliz, a felicidade lhe espera logo ao lado de braços abertos. Continue forte, leal, justa, íntegra, corajosa, engraçada e não esqueça que você é linda por dentro e por fora, que seus valores e suas percepções de mundo são mais aguçadas que as da maioria das pessoas, que muitas oportunidades lhe foram dadas e com isso muitas responsabilidades devem ser assumidas. Não se esqueça que você é privilegiada e que é acima de tudo muito amada."

(...)

PS.: Eu sei que a carta é nossa, mas também sei que você lê o blog de vez em quando. A saudade virou dor crônica como a artrite e a artrose dos velhinhos!

quarta-feira, 23 de maio de 2012

Rezar

Rezar é bacana. Acalma a alma e faz alguma coisa acontecer na sequência com a mesma naturalidade do sol. Afasta o fantasma do medo. Meio parecido com o amor, aquele abstrato absoluto que feito oração, é tão recitado. Como o amor, uma oração é um mergulho que não se dá em água rasas. Não casa com superficialidade, tem que ir um pouco mais para dentro. Às vezes, tem até que faltar o ar para a gente lembrar de rezar. Rezar que não é somente uma repetição de palavras bonitas mas também o cavocar do chão de dentro em busca do fio condutor. O fio que nos liga ao infinito que nos rega de águas frescas pela janela que nunca se fecha. Mas como?

A gente se pergunta: Para quem se reza? Por que se reza? Para quê?
Você fecha seus olhos, encolhe-se em suas entranhas e busca. Rezar é como sair para procurar. O retorno, o caminho de volta ao colo que nos embala na origem. Na essência. A gente quer o encontro. Reza-se ao incomensurável que parece maior que tudo e ao mesmo tempo parece estar ao alcance de um abrir e fechar de nossos olhos. Reza-se porque somos frágeis e porque adoramos o mistério. Rezamos pela ligação inegável que temos com o infinito na tentativa tão bonita de re-ligar. Unir nossa humanidade com a nossa divindade. Rezamos para pedir. Um pouco mais de calma, um pouco mais de sabedoria. Saúde, prosperidade, amor, perdão, rezamos pelo imaterial. Pedimos luz para nossos corações-candeeiros. E sempre somos atendidos, mesmo quando isso passa despercebido. Toda prece faz sentido.

Parece-me, no entanto, que a forma mais genuína de oração é o ‘agradecer’. Deixar desfilar pela consciência todos os benefícios dos nossos dias: O osso que quebrou e colou, o osso que não quebrou, a vizinha que baixou o som, o primeiro passo de uma recuperação, a beleza de uma nova estação. Agradecemos por não ter sido pior e pelo melhor que conseguiu acontecer. Agradecemos os sorrisos que são tantos, e agradecemos as águas do nosso pranto. A gente agradece as marcas que ficam. Na pele, nos olhos, na alma, na vida. A gente agradece as cicatrizes, nossas tatuagens, símbolos de superação. A gente agradece a miríade de sentimentos sentidos, e agradece todos os sentidos que dão sentido à vida de cada um. A gente agradece a grandiosidade da vida e as pequenezas que nos fazem tão bem. A gente reza.

E assim acontece. A cada manhã, antes de dormir, no meio de uma dor, de um desespero, na agudez de uma angústia, no êxtase de uma conquista, no agradecer de tantas graças. Em cada par de olhos, uma oração. É estranho. Bastante estranho esse mundo de estranhezas bonitas. A fé. O sal de toda prece que à quase tudo parece poder transformar, pode fazer de um muito simples abrir e fechar de olhos que acredita na vida um gesto de que salva, que transforma carência em coragem, em força, em alegria e em muito mais amor para nossas vidas. A fé é a água fresca que liberta-nos da dor . É linda, brilha e como um ser sussurrante que se esbalda dentro da gente, quer sempre nos lembrar : num abrir e fechar de olhos tudo pode mudar.

segunda-feira, 21 de maio de 2012

O moço que entrega panfletos

Arrumo o meu cabelo e ele ajeita a camiseta. Existe alguma coisa entre nós: uma vontade mútua de não sermos cinzas. Van Gogh nos borrou de verde-água, e agora nós dois nos reconhecemos, apesar da multidão. Eu, a moça que sai da faculdade, e ele, o moço que entrega panfletos do dentista. É claro que eu sou muito mais do que uma moça que sai da faculdade e ele é muito mais do que um moço que entrega panfletos na rua. Mas tudo o que sei sobre ele é que uma obturação custa menos de dez reais e tudo o que ele sabe de mim é que meu sorriso é amplo e gratuito. Assim, a nossa relação gira em torno de dentes: fortes e insuperáveis. A multidão me atropela, assim como atropela e pisoteia os seus panfletos, mas eu paro por nove segundos, como se apanhasse a última edição do jornal, leio as suas manchetes odontológicas, sorrio ao meu amigo e digo... muito obrigada! A multidão o atropela, assim como atropela e pisoteia os meus amuletos, mas ele para por nove segundos, como se me entregasse os mais belos poemas camuflados, sorri e me diz... boa noite! E eu vou embora, com o nosso segredo guardado no bolso. Ali está meu cavaleiro andante e sua armadura de plástico, colorida, com os preços estampados.

P.S: o texto tem no mínimo 5 anos, certas poesias nunca mudam.